Pare um pouco e deixe sua imaginação tomar asas. Comece imaginando estar acima das nuvens, sobrevoando a geografia terrestre, enquanto a aeronave faz manobras na imensidão azul. De agora em diante, se tiver paciência, leia a crônica de uma mineira a caminho do Rio de Janeiro, numa bela manhã de setembro.
Os voos não foram os mesmos. Por questões de “logística”, o marido foi por uma companhia aérea e a mulher, por outra. Ela embarcou primeiro. Sentiu aquele frio na barriga, sensação consequente da decolagem. Rezou, pediu perdão a Deus por todos os seus pecados. Imaginou que alguma coisa estranha pudesse acontecer. O dia era 7, o voo 1309. Dois números supersticiosos e... nada de ruim. Quarenta minutos após o avião ter se alçado no espaço, já estava em terra firme, na cidade maravilhosa. Pelo relógio, calculou que ainda faltava mais de uma hora para seu marido aterrissar em solo fluminense.
Todos os dias pela internet, ela acessa o site Ego e costuma ver notinhas de famosos que circulam pelo Santos Dumont. Teve, então, a brilhante e, diga-se de passagem, a patética e apatetada ideia de “passear” pelo aeroporto à procura de celebridades. Estava calçada com uma sandália confortável, comprada às pressas, depois de ter tirado um “bife” no seu dedo direito, causando-lhe uma inflamação terrível. Aliás, o “bife” dava para um rodízio inteiro. Instalou-se um buraco no pé da desastrada, e mesmo manquitolando, lá foi ela aventurar-se pelo saguão do S.D., puxando sua mala de alças e rodinhas, ora essa! Deu uma bisbilhotada nas lojas da galeria, nos cafés e, já apresentando aparente cansaço, decidiu-se sentar-se em frente à sala de embarque. Ao seu lado, uma senhora parecia aguardar por algo ou alguém. Para não morrer de tédio, a mineirinha pôs-se a imaginar-se em um diálogo com sua vizinha de cadeira:
- Oi, tudo bem? Tá indo pra onde?
- Para São Paulo e você?
- Acabei de chegar de “Belorizonte” e tô esperando meu marido que está vindo pela TAM. Eu vim de Gol. Sabe, é mais em conta e a TAM, bem... A TAM não me traz boas lembranças...
- Eu vou pela TAM, aeroporto de Congonhas.
- Ó, que legal! São Paulo é “tudibom”!
Silêncio. Tensão. E a mineira continua:
- Cê já viu algum famoso circulando por aqui?
- Não.
- Ah, “poizé”. Eu sempre leio pela internet que eles passam por aqui. Tem até paparazzi de plantão. Eu os vejo pela internet.
- Sei.
- “Minina”, eu queria tanto ver uma celebridade. Sabe, chegar em beagá e contar que vi fulano, beltrano; nó, seria bom demais da conta. De preferência uma celebridade de primeira grandeza, tipo Fernanda Montenegro, Tony Ramos, o Gianechini...
- Não creio que passem pelo S.D. Devem circular pelo Galeão Tom Jobim, que é internacional.
- Pensando bem, tem razão... Então pode ser uma subcelebridade mesmo, um ex-bbb, uma mulher-fruta, a pera, a melão, a melancia...
- Tem mulher maçã também.
- Nó, já chegou na maçã? Tá feio o negócio.
- É.
- Na verdade, se eu visse o Latino já ficaria feliz. Tão bonito ele, aquele rebolation... Ou até o Dado Dolabella! Ele sempre passa pelo S.D. É o que diz no Ego.
- O Dado? Mas ele não está preso? Parece que andou batendo na mulher.
- Preso ele não tá, mas pensando bem, acho que estou no lugar errado. Os famosos do Rio não vão embarcar em fim de feriado. Estou na sala de embarque dos anônimos. Eles estão é na sala de desembarque. Vou lá. Boa viagem procê, viu! Tchau.
- Até logo.
Finalizou sua conversa imaginária e lá foi a destrambelhada aeroporto afora. Sentou-se em frente à sala de desembarque. Não demorou muito e ela viu passar diante de si um jogador de vôlei. Imenso. Era o Rodrigão, da seleção. Pelo menos já tinha visto alguém... Soube, naquele momento, que havia estado no lugar errado por tanto tempo! Já satisfeita por ter visto o atleta, eis que ela ouve um vozeirão, vira-se, olha e reconhece o ator. Ele faz “Escrito nas Estrelas”, o pai do ‘Gilmar’. E quem disse que ela lembrava o nome do homem? Veio também uma repórter da Globo, acho que esportiva, baixinha. Mas o horário nobre deu suas caras por lá também e eis que vem andando em direção da afoita mineira, o moço de cabelos e barba vermelha – “Gente, o filho do Tony Ramos, o italiano! Ai, acho que é Adamo...” Ensaiou um ‘buona será’ para dizer ao rapaz, só que travou. Ela olhou para ele, sorriu. Ele sorriu de volta, simpaticamente. Mas ela não verbalizou palavra alguma, nessuna, neanche um ‘ciao, come stai?’
Pamonha, pensou. Fala tanto e na hora de tietar um quase-famoso, não parla niente, nula! O grupo global seguiu junto, foram-se. Ela avistou seu marido chegando. Abraçaram-se afetuosamente, juntos novamente. Ficou feliz e aliviada. O dia 7, no voo 1309 (mês nove, setembro), parecia uma combinação macabra, mas quem sabe apenas bons números para se jogar na mega-sena? Ah, e ela concluiu que a figura mais famosa e célebre que vira em terras cariocas, fora o Cristo Redentor.
Mas, o que tem a Carol Castro a ver com o título da história?
É que na volta para Belo Horizonte, a atriz estava no mesmo voo com a mineira, pela companhia aérea Webjet. No fim de semana , a global se apresenta com Marcelo Faria, no teatro Sesi Minas, o espetáculo “Dona Flor e Seus Dois Maridos”. Se soubesse antes, não teria corrido tanto pelo aeroporto que homenageia o ilustríssimo pai da aviação, nosso querido Santos Dumont.
É muito interessante, e bonito, a facilidade de se lidar com as palavras, de moldá-las aquilo que nos projetamos.
ResponderExcluirVocê faz isso muito bem... parabéns.
Muito gostoso de ler esse texto.
ResponderExcluirEu, também mineira, mas de uma cidade bem menorzinha que beagá, sou sempre deslumbrada com as cidades grandes. A primeira vez que andei de avião me senti criança, embora tivesse já com meus 20 e alguns anos.
abraços