Vários dias após a eleição do século, ainda vejo resquícios do que foi este tumultuado pleito para elegermos o presidente do Brasil. "Nunca antes na história deste país" viu-se tanto ódio entre os eleitores. O país ficou dividido entre aqueles que acreditam ser o PT a maior chaga do povo brasileiro, representado por Dilma Rousseff, e entre aqueles que viam em Aécio, do PSDB, o salvador da pátria! Algumas amizades foram rompidas. Como num raio x, as personalidades foram reveladas a partir da ideologia política de cada um. Nas redes sociais, o caldo ferveu e entornou.
Virou guerrinha pessoal. Cada um queria mostrar que estava certo - o seu (ou a sua) candidato/a era o/a melhor. Poucas pessoas se preocuparam em mostrar aquilo que o seu escolhido tinha de bom para merecer seu voto. Ao contrário, apegaram-se nos erros alheios para fundamentar suas escolhas. E por aí vimos um bangue-bangue virtual jamais acontecido antes. Vinham tiros de todos os lados. Para os psdbistas, o PT era o partido dos pobres, analfabetos, vagabundos, petralhas, mensaleiros, bolivarianos, comunistas e etc. Para os petistas, o PSDB era o partido dos coxinhas, mauricinhos, ricos, estudados, direitistas, classe média alta.
A turma do Aécio jogava pedra nos projetos sociais. O bolsa-família era bolsa-esmola, bolsa-preguiça, turma de vagabas, e coisas do gênero. Para a turma da Dilma, Marina e Aécio seriam o retrocesso, a volta das privatizações, o estancamento da redistribuição de renda, o fim dos benefícios, blablablá... Até que, em um dos debates, Aécio Neves, mineiro como eu, de Belo Horizonte, como eu, decidiu chamar para si a paternidade do bolsa-família. Logo o bolsa-família, execrado por seus eleitores. Sem saberem como funciona o programa, berravam - postando - suas indignações sobre aqueles pobres que recebiam sem trabalhar.
Acho que pouca gente sabe que a alíquota destinada ao Bolsa-Família equivale a 0,05% do PIB nacional. Isso é muito pouco. A corrupção surrupia muito mais recursos para os bolsos dos endinheirados políticos safados, que não pensam duas vezes antes de superfaturarem obras e levarem para si quantias astronômicas. Será que você se lembra de qual deputado e senador votou? E que o Congresso é mais sujo do que o rio Tietê? Não, né! O que mais me espanta é não entender como algumas pessoas criticam o Bolsa-Família (0,05%) e ao mesmo tempo nem ligam de doar 10% dos seus ganhos para enriquecer pastores. Não entra na minha cabeça. Quer dizer que o pastor pode receber o bolsa-dízimo, ficar cada dia mais rico ( o Silas Mala-Faia está entre os mais ricos do Brasil), ter concessão de rádio e TV sem problemas. Mas aquele cabra nordestino, que comia calango, rato, bebia água de cactos não pode receber o "bolsa-esmola"?
O que é isso, minha gente? Que pensamento burguês é esse? De onde saíram tantos eleitores odiosos? Qual o motivo real da xenofobia contra os nortistas e nordestinos, sendo que foi Minas Gerais e Rio de Janeiro que decidiram a eleição a favor da Dilma? O Brasil ainda é um país de pobres - como disse minha mãe em resposta à pergunta do dentista dela - um pequeno burguês eleitor de Aécio. Aliás, a turma da medicina se mobilizou como nunca. Nem mesmo para exigir melhores condições de trabalho, a categoria se fechou tanto em torno de um propósito - eleger Aécio. Seria recalque pelo programa Mais Médicos? Hum... Quem saberá!
Mas não pense que a eleição se dividiu entre ricos e pobres, não. Eu vi muita gente de baixa renda declarando voto no Aécio. Muita gente meeeesmo! E vi poucos, muito poucos ricos fazendo o mesmo com Dilma. A propósito, pior do que ouvir frases machistas de homens a respeito da figura da presidente, foi ter que ouvir as mesmas frases vindo da boca de mulheres! Coisa mais deprimente é mulher machista! Xingaram a Dilma de gorda, de feia, de dentuça. Chamaram a Dilma de tudo quanto é nome que me envergonho de reproduzir aqui. Logo ela, uma mulher forte, de fibra. Ela é uma mulher honesta. Se não é, me provem. Provar - com dados e fatos. Em qual governo um presidente não mandou engavetar os processos de corrupção? No governo da Dilma. Os mensaleiros foram presos. Ela não foi conivente com pessoas do seu próprio partido - sangrou a própria carne. Ah, mas isso a turma do aeroporto de Cláudio não leva em consideração.
O Aécio é um cara bem apessoado, né! Bonitão, articulado, boa oratória.... Mas cínico até mandar parar. Aécio perdeu a eleição não foi porque Dilma era mais brilhante, mais bonita, mais querida. O pior inimigo de Aécio foi ele mesmo - debochado, irônico, desrespeitoso com Dilma nos debates - colocando o dedo em riste para ela e chamando-a de leviana. Aécio cantou vitória antes do tempo, disse que já estava eleito, que o povo queria mudança (mas ele ia continuar com o bolsa-família...). Aécio calçou um Louboutin e saiu desfilando no seu carro alegórico e patético do "já ganhei, já ganhei, sou lindo, rico e famoso". Aécio caiu do salto e caiu do cavalo.
Eu desejo, apesar de toda essa podridão vista nesta campanha horrorosa, que tanto Dilma quanto Aécio cumpram bem o seu papel - a primeira de líder suprema da nação, que vai combater a corrupção, melhorar a economia, a educação, a segurança... Uma presidenta tem que fazer valer a frase da bandeira - Ordem e Progresso. Quanto ao Aécio, que ele faça uma oposição digna, sem baixarias. Que ele olhe para o povo de Minas, o estado que ele abandonou para ir morar no Rio, um estado que também não o elegeu. Aécio precisa se autoconhecer! Precisa ser mais humilde! O povo pode até votar, mas não elege político soberbo!